Monday, June 18, 2012



ARQUEOLOGIA DA PALAVRA




HELENA CARDOSO LIXA




Pesquisa desenvolvida para a Disciplina de Interpretação, ministrada pela Prof. Dr. Lucia Romano.



UNESP/SP
ABRIL/2012



Arqueologia da Palavra
Termo escolhido: Representação

Ao pesquisarmos a linguagem teatral, muitos termos aparecem em nosso discurso sem que de fato nos apropriemos das diferentes significações da palavra. Com o propósito de esclarecer um caminho de apropriação da palavra representação, tracei o seguinte percurso.
PAVIS (1999) elenca as imagens que o termo representação sugere nos idiomas alemão, francês e inglês. Das Na definição trazida da palavra inglesa performance, representação seria: “...uma ação realizada (to perform) no próprio ato da apresentação (...) envolve ao mesmo tempo palco e plateia (...) por toda a equipe que se ‘realiza’ cenicamente (artística e socialmente)”. Por reunir os diversos elementos que compõem uma apresentação cênica (atores, público, equipe técnica, tempo, espaço, ação) a definição serve como nosso ponto de partida.
Na língua inglesa, performance pode ser utilizado em diferentes contextos. Em primeiro lugar (conforme definição de The Routledge Companion to Theatre and Performance, de Allain e Harvie, 2006), o termo designa um ato de apresentar, na presença de uma plateia,  algo que foi previamente preparado. Tal uso da palavra se refere a qualquer apresentação das artes performativas, incluindo o teatro, a dança, o circo, as artes marciais, os happenings e as apresentações improvisadas, entre outras. O termo também pode designar todo comportamento social (incluindo o comportamento diário e ritual); o rendimento, ou a capacidade de alcançar objetivos (como um motor de um carro, as estratégias financeiras de uma empresa ou as conquistas de um atleta); a arte da performance ou a body art (em que se privilegia a presença e corporificação do artista com o objetivo de reforçar uma narrativa, representação ou identidade coerente, que defendam certos objetivos políticos); e a desconstrução da atuação (acting) no teatro nos moldes realistas de caracterização, (constituída com o objetivo de questionar as “verdades” apresentadas em cena, como as práticas dadaístas, futuristas e expressionistas e o teatro didático brechtiano).
Cada uma das definições acima traz maneiras distintas de compreender o termo representação. A primeira definição citada coincide com aspectos apresentados no verbete acting, que também relaciona-se à atividade de representar na cena e no teatro: acting é a arte de representar no teatro, na qual o ator emprega seu corpo e voz. Acting é ao mesmo tempo intencional e teatral, em contraponto a outras formas de representação (performance, no original em inglês), como por exemplo um ritual ou um protesto. ALLAIN e HARVIE (2006) esclarecem que a representação (acting) é intencional, por se tratar do resultado de uma auto-reflexão do ator sobre sua prática, sua estética e função social. Além disso, é teatral porque, geralmente, é mimética: imitia aquilo reconhecido pelo senso comum por realidade. Por esta razão, a representação está relacionada a seu contexto social e nele interfere.
Com relação à função da representação e como ela é realizada, ALLAIN e HARVIE (2005) pontuam que o treinamento físico e intelectual ganhou forte aceitação em fins do século XIX, e dele derivam conceitos difundidos desde meados do século XX, tais como foco, controle, pesquisa, preparação psicofísica e interpretação de texto. Entretanto, ressaltam que ainda hoje a espontaneidade, a presença e a “ação realizada (to perform) no próprio ato da apresentação” - ainda são facetas da representação consideradas nos estudos teatrais contemporâneos.
Para BARBA e SAVARESE, a criação de um sistema corpo-mente orgânico tem implicações na representação. Um corpo que responde a todo impulso mental pede a integração entre as sensibilidades cênicas. A construção dessas sensibilidades e sua relação são condições básicas para a criação de um personagem (character) e de um papel (role), conceitos definidos na teoria de Stanislavsky, a qual serve de base para toda a estruturação da metodologia de Barba ali discutida.
Para FERRACINI, a representação dá-se por meio de ações físicas e vocais orgânicas, retiradas de um vocabulário próprio. Ações físicas podem ser divididas em duas partes complementares: a corporeidade (aspectos internos da ação) e a fisicidade (aspectos formais da ação). Qualquer intenção de semântica ou expressividade é ação física, não limitando a transmissão de um significado somente ao texto dramatúrgico. Este conceito amplia a definição de representação para além dos limites da representação textocêntrica, ainda frequente nos palcos ocidentais na contemporaneidade.



BIBLIOGRAFIA

ALLAIN, Paul & HARVIE, Jen. The Routledge Companion to Theatre and Performance. Londres: Routledge, 2005.
BARBA, Eugenio & SAVARESE, Nicola. A dictionary of theatre anthropology: the secret art of the performer. Londres: Routledge, 1991.
FERRACINI, Renato. A arte de não interpretar como poesia corpórea do ator. Campinas: Editora da Unicamp, 2003.
PAVIS, Patrice. Dicionário de Teatro. São Paulo: Perspectiva, 1999.



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